Mórmons Reagem Contra Discriminação

Membros da Igreja SUD reagem às mudanças de política eclesiástica.

[UPDATE: Milhares de membros SUD pedem resignação da Igreja em protesto!]

Mórmons manifestando a favor de tratamento igual e ético para membros LGBT

Mórmons manifestando a favor de tratamento igual e ético para membros LGBT

A Igreja Mórmon alterou suas políticas internas na semana passada para oficialmente discriminar contra famílias LGBT e crianças em tais famílias. O anúncio destas mudanças, forçado pelo vazamento inesperado do secreto sagrado manual oficial, gerou reações diversas, e surpreendentes, entre membros da Igreja.

O irmão do Apóstolo D. Todd Christofferson, escolhido para explicar o vazamento das mudanças na política oficial da Igreja, é homossexual assumido. O podcast ‘Fé Racional’ entrevistou Tom Christofferson sobre suas percepções pessoais, e ele expressou preocupação pelos sentimentos e pela fé das famílias e das crianças envolvidas, enfatizando a necessidade de tratá-los todos com dignidade e amor, apesar da desnecessáriamente intimidante situação social imposta pela Igreja.

“Isto também passará; nós vamos passar por isso como temos passado por todo o resto.

Minha preocupação seria que isso coloca mais pressão sobre as famílias, também, e a capacidade de lidar com a dissonância e ambigüidade pode ser ainda mais um desafio do que fora antes.

Eu me preocupo com as pessoas que vêm depois de mim. Será que eles vão ter a mesma oportunidade? Será que eles vão ser capazes de ir à igreja, mesmo que eles estejam em um relacionamento do mesmo sexo monogâmico e comprometido e sentir-se bem-vindos? Para fazer com que ambos se sintam bem-vindos e fazer um lugar na congregação para ambos? Ou será que estamos afixando uma letra escarlate, e não podemos fazer isso, e muito menos com as crianças?

Também me parece que [a Igreja] continua a tratar as pessoas como grupos em vez de individualmente. Eu sinto que meu relacionamento com o Salvador é individual. Se existe uma preocupação sobre uma família, então vamos lidar com essa família. Existe uma maneira para que nós possamos fazer as crianças sentirem-se mais bem-vindas na primária? Podemos garantir que o bispo conhece as mães ou os pais bem e que os mestres familiares estão ajudando se houver dificuldades? Parece-me que, se a preocupação é que se nós sentimos que há pecado sexual existente, então eu acho que a política deve ser que em qualquer família, onde haja pecado sexual lá, que possa haver uma entrevista adicional ou processo necessário para a ordenação das crianças. Isso seria ótimo, e se fosse assim, o bispo lidaria  muito mais com famílias heterossexuais do que com as famílias gays.

Então, vamos definir o que nós realmente estamos tentando fazer e depois ministrar indivíduos e não agrupar todos juntos como um grupo.

Eu me preocupo com as famílias que estão envolvidas com isso nesse meio tempo. Ao mesmo tempo, andar neste caminho de fé e esperança que também compete a mim e a todos nós que tivemos nossos corações quebrados por essas mudanças para abordar muito mais com amor e aceitação aqueles que são afetados por elas e o que quer que eles pensam ser o melhor caminho para si neste momento.

Francisco Negron, um jovem de 17 anos preparando-se para servir sua missão de tempo integral, e sua família reagiram de maneira mais enfática.

Negron está terminando o colegial e já tinha tudo planejado para servir sua missão assim que completasse 18 anos de idade e terminasse o colegial.

“Eu pensei que seria uma experiência maravilhosa e bonita apenas ser capaz de tocar as pessoas, e tornar-se uma parte da vida das pessoas assim, e apenas servir por dois anos, eu pensei que seria uma grande experiência.”

Contudo, as novas mudanças de regras diretamente afetam-no. Os pais de Francisco, ambos membros ativos na Igreja, são divorciados, e seu pai assumiu sua  homossexualidade após o divórcio e casou-se novamente e vive com o seu atual marido.

A mãe de Francisco, Kristine Ellis, missionária retornada e até aqui a maior incentivadora da missão do filho, explica o dilema:

“Para ele, a regra é criada essencialmente, que, se ele quiser sair em missão, ele tem que receber permissão especial e ele tem que denunciar o relacionamento de seu pai, e ele tem que denunciar sua crença no casamento homossexual. Então, se ele não fizer isso, a decisão já foi feita por ele. “

Franciso complementa com seus sentimentos pessoais:

“A fim de ir nessa missão de serviço e amor, dizer ao meu pai que eu não aprovava dele, e da maneira que ele conduz a sua vida, e realmente isso não parecia … me parecia hipócrita para mim. Basicamente, eu tenho que dizer que eu não acredito em [casamento gay] mais … mas eu acredito, por isso descartou-se a possibilidade de, a partir de agora, ir para a missão. “

Ellis, a mãe de Francisco, enviou uma carta de resignação no dia seguinte, afirmando para o seu filho e para o seu ex-marido que não desejaria permanecer como membro fiel de uma Igreja que discrimine-o assim, e chantageie o seu filho para discriminar o próprio pai dessa maneira. Negron, o pai de Francisco, ainda gostaria que seu filho servisse sua missão, mas respeitando a decisão do filho, está discutindo com ele uma missão voluntária com o Corpo da Paz.

Francisco

Francisco Negron e mãe, Kristie Ellis, renunciam à Igreja em soledariedade ao pai e ex-marido gay

Do outro lado do espectro, uma menina de 7 anos e 11 meses precisa contemplar escolher entre sua religião e seu pai.

Randon Spackman, 36 anos, é casado com seu marido Ben Christensen, também de 36 anos, e tem uma filha que completará 8 anos em um mês. Spackman relata que sua filha é muito ativa na Igreja SUD e há meses está animadíssima para o seu batismo que se aproxima.

“Ela está esperando para ser batizada há tanto tempo e, em daí, de repente, apenas um mês antes a política muda, e ela não pode ser elegível mais. Eles a estão tratando de forma diferente, não por causa de qualquer coisa que ela fez, mas por causa do que eu tenho feito.”

Seu marido, Christensen, também está passando pelo mesmo dilema. Ele tem uma filha de 5 e um filho de 9 anos de idade.

“Potencialmente significa que minha filha de 5 anos de idade não será capaz de ser batizada e que o meu filho de 9 anos de idade não será capaz de ser ordenado.”

Christensen and Spackman estão casados desde janeiro de 2015. Ambos são missionários retornados e ambos casaram-se no templo com seus ex-mulheres. married in January. Eles saíram da Igreja para poder se casar, mas mantêm-se muito presentes nas vidas de seus filhos, inclusive morando com eles em guarda compartilhada. Por isso não concordam que seus filhos sejam penalizados por suas escolhas de vida (i.e., casar-se).

“Agora eu estou em uma posição, que só pela natureza da minha existência, eu estou no caminho deles serem capazes de ser batizados ou ser ordenado.”

Revoltados com esse endurecimento discriminatório contra famílias LGBT, muitos Mórmons criaram uma petição para a Confederação de Futebol Americano Universitário para boicotar jogos contra a BYU (universidade da Igreja SUD) em protesto.

Ademais, dezenas de membros da Igreja se organizaram para resignações em massa.  Leah Leavitt, uma das organizadoras, disse em entrevista:

“Eu acho que é o único trunfo que realmente temos com que se preocupam, é os seus números, por isso estamos apenas mostrando que nem todo mundo os apóia, eu conheço um monte de membros que estão em conflito sobre isso, e eu não acho que isso seja correto.”

Dezenas e dezenas de outros membros da Igreja estão ameaçando ou contemplando em mídias sociais e entre grupos de amigos submeter seus nomes para resignação da Igreja.

Wendy Montgomery é uma membro ativa e fiel, cujo filho de 17 anos saiu do armário como gay.

“Parece que eles estão estendendo um ramo de oliveira apenas para bater em você com ele, é como um solavanco emocional brutal.”

Montgomery relata que a notícia das novas regras partiu o coração de seu filho e o deixou deprimido, forçando-a e ao seu marido contemplar abandonar a religião que eles vinham desesperadamente esforçando-se para seguir, a despeito da dura e cruel recepção de seu filho.

“Eu posso entender um pouco a posição dura sobre o casamento homossexual, mas eu não posso compreender discriminar filhos dos casais homossexuais. Acabamos de colocar uma letra escarlate sobre estas crianças. Esta não é a minha igreja. Eu não vejo Deus nela. Eu não vejo divindade nela. Simplesmente me parece maligno isso.”

Tiffany Hales, outra membro fiel e ativa, desabafa na sua página de mídia social:

“Meus três lindos filhos são o produto do meu primeiro casamento com um homem gay. Meu ex-marido é um ser humano incrível com um coração muito generoso e compassivo. Eu o amava quando estávamos casados e eu ainda o amo até hoje.

Quando meu ex-marido e eu nos divorciamos nós concordamos que nossos filhos continuariam a ser criados como SUD. Enquanto eu sei que meu ex-marido tem uma série de problemas com a Igreja SUD, para seu crédito ele tem sido um apoio incrível de criar nossos filhos SUD.

Da mesma forma que eu não desmereço meu ex-marido e seu parceiro para os meus filhos. Eu não quero que meus filhos tenham jamais que escolher entre sua religião e seu pai. Meu ex-marido é o pai dos meus filhos e eles o amam.

Como parte de nossa sentença de divórcio ambos têm a custódia legal e física conjunta de nossos filhos. Ele tem os mesmos direitos legais que eu em relação às crianças.

Em que eu carinhosamente chamo de loteria de “liderança”, é perfeitamente concebível que o meu filho possa ter um bispo que nega ao meu filho a oportunidade de avançar na igreja, simplesmente porque o pai do meu filho está em uma relação homossexual. MEUS FILHOS NÃO TÊM NADA A VER COM SEU PAI ESTAR EM UMA RELAÇÃO HOMOSSEXUAL.

Lamento que isso pareça como um castigo para os meus filhos que simplesmente nasceram para mim e meu ex-marido, não por culpa deles próprios.

Então, quando você ler sobre o acirrado debate sobre esta nova política, por favor tenha em mente que os meus filhos lindos, que têm testemunhos profundos do evangelho junto com sua mãe, suportam o peso dessa mudança muito mais pesadamente do que a maioria.”

Outros membros da Igreja sofreram convulsões familiares com essas mudanças, como informa uma das pessoas afetada diretamente:

“Minha ex-esposa decidiu me levar ao tribunal para levar os meus filhos longe. Isso tudo aconteceu ontem. Eu sou gay e nos divorciamos em março de 2012 e que foi, até ontem, tudo bem.

Eu concordei no divórcio em permitir que ela criasse as crianças na igreja. Aparentemente, ela agora sente que ela não será capaz de fazer isso, a menos que ela tenha a custódia total. Porque sob a nova política, as crianças não podem progredir na igreja, se elas têm um pai em uma relação de mesmo sexo.

Eu tive uma discussão de 10-15 minutos com as crianças no sábado sobre a nova política. Basicamente, eu disse a eles sobre isso e que eu não sei o que significa. Eu disse ao meu filho de 11 anos que pode significar que ele não possa se tornar um diácono. Mas, a única coisa que ele afirma claramente é que eles precisavam me repudiar se eles quisessem sair em uma missão. E isso é o que tem sido extremamente doloroso para mim.

Eu acredito no livre arbítrio e teria honrado e respeitado sua escolha para irem em uma missão. Se e quando o tempo viesse. Agora, dado o fato de que eles devem me repudiar e obter permissão especial, é uma loucura.

Eu reconheço que ela tem um medo terrível; talvez nenhum de nossos filhos vão ficar na igreja com base nesta política. Eu respeito que meus filhos vão fazer a escolha certa. Estou tão irritado que a igreja criou uma situação que uma criança precisa repudiar o próprio a fim de alcançar o amor de Deus. “

Mitch Mayne, membro ativo da Igreja e homossexual assumido, que servia até pouco tempo atrás no Bispado de sua Ala em São Francisco, crê que essas mudanças representam uma encruzilhada para a Igreja:

“Mórmons têm uma história longa de perseguir indivíduos LGBT. Pense em 2008, quando o nosso envolvimento na Proposição 8 da Califórnia causou tanta dor e sofrimento para os nossos irmãos e irmãs LGBT. Não tão visível foi o conflito que causou dentro de nossa própria comunidade mórmon. Perdemos muitos mórmons com a campanha feroz de apoio ao Prop 8, mães lançados contra filhas, e pais contra filhos – famílias sofrendo erosão, a pedra fundamental da igreja

Apenas sete anos depois, e é “déjà vu tudo de novo”, como diria o Yogi Berra.

Desta vez parece mais auto-mutilação. Em vez de fazer campanha para impor políticas públicas inconstitucionais no resto do mundo – uma batalha que perdemos quando a Suprema Corte dos EUA confirmou as decisões do tribunal de apelação em apoio ao casamento homossexual – parece que estamos cortando o proverbial nariz para despeitar a cara. Em suma, temos dito aos membros LGBT que se recorrerem a este direito legal, eles vão ser excomungados da Igreja e, pior ainda, que os seus filhos (adotados ou naturais) será penalizados por transgressões de seus pais – Ignore que a própria igreja mantém A segunda Regra de Fé que corajosamente afirma que as pessoas são responsáveis apenas por suas próprias ações, não as de seus pais.

Mas há pouco equilíbrio, negociação, ou a mão de companheirismo para ser encontrados nas novas políticas estabelecidas na semana passada. Não deve ser nenhuma surpresa que muitos Santos dos Últimos Dias vêem pouca evidência de mão de Cristo nelas.

Talvez coisas boas vão surgir a partir deste último revés. Na esteira embaraçosa da Proposição 8, Mórmons dedicados começaram a participar nas celebrações do orgulho LGBT em todo o país, estendendo a mão da amizade e boas-vindas que muitos nas duas comunidades queriam e precisavam. Congregações inteiras em San Francisco, Seattle, Portland e Boston começaram aproximação com membros LGBT, convidando-os para voltar, assim como eles são – solteiros, casados com alguém do seu próprio sexo ou em qualquer outra situação. Estes Mórmons eram – e ainda são – exemplos incríveis de amor incondicional de nosso Salvador.

Mas, assim como a Prop 8, o anúncio da semana passada mudou a paisagem mais uma vez. Um e-mail que recebi de uma Santa dos Últimos Dias ativa parecia captar a ira de muitas como ela: “Eu tenho sido uma adversária firme contra o casamento LGBT. Mas isso … isso, especialmente com a exclusão das crianças, é demais para eu suportar. ” Temos, em essência, empurrado os extremos para fora, e o centro para os extremos. Em vez de esmagar a vontade de reconciliação entre as duas comunidades, nós provavelmente a estocamos.”

Uma brilhante mulher membro da Igreja cujos pais administram um casamento de orientações mistas (seu pai é gay, sua mãe não), abriu seu coração sobre essa nova política discriminatória, vendo-o sob o prisma de alguém que teria sido diretamente afetada, imaginando como lhe teria sido se seus pais tivessem se divorciado e seu pai casado com alguém por quem tivesse se apaixonado:

“A política é clara … Eu não poderia ter sido batizada.

Eu sei que eu teria ficado devastada. Na minha história existente, a igreja foi um dos poucos lugares de conforto para mim enquanto criança – Eu só posso imaginar o que seria ainda mais se eu estava lidando com o desmembramento da minha família. Não, por um segundo, pense que você estaria me protegendo de qualquer coisa, não sendo permitida a ser batizada teria sido uma fonte de profunda tristeza e vergonha para mim. Para não mencionar o que este teria feito a minha mãe, que era e é uma membra comprometida da igreja. Isso teria absolutamente quebrado seu coração. Para adicionar esse peso sobre ela depois de tudo o que ela carregava … não há palavras para expressar essa crueldade. E eu tenho que saber o que teria ocorrido com a minha relação com o meu pai? Teria ele se ressentido? Eu teria sido capaz de superar a terrível retórica usada para com os nossos irmãos e irmãs LGBT e realmente ver o meu pai para o homem incrível, e Cristão, que é? Espero que sim, mas eu não sei. Estou absolutamente certa de que essa política teria destruído a minha família de maneiras que eu não posso nem imaginar.

O que é mais trágico para mim é que não temos que imaginar isso como cenário hipotético. Há crianças hoje que estão sofrendo por causa dessa política incompreensível e completamente injustificável. Eu sei de duas crianças cujos batismos foram marcados para amanhã, mas tiveram suas ordenanças salvadoras canceladas porque seus pais estão em relacionamentos homossexuais. Pense no que acabamos de fazer com suas vidas. Nós devemos nos envergonhar.

Eu não gosto de escrever posts como este. Eu gosto de abordar as coisas duras a partir de um local de medição e ponderação. Talvez eu devesse ter tido tempo para trabalhar através da minha raiva e tristeza. Mas eu tenho que estar no registro como dizendo NÃO a isso. Se existe alguma coisa que a Igreja Mórmon tem-me ensinado é que a minha família vale a pena defender.

Eu não vou ficar em silêncio.

Isso é errado.

Isso não é de Deus.”

Seu desabafo inteiro vale a leitura para quem estiver interessado e puder ler em inglês.

Um pai de família homossexual escreveu uma carta aberta à Igreja SUD que está rodando entre membros nas mídias sociais. Nela, ele expressa a dor que sente por seus filhos:

“Cara Igreja Mórmon,

Eu não posso, neste momento, chamá-los de “santos” como sua atitude atual é muito não-santa.

Essa é uma das maiores ironias para as pessoas LGBT: Por muitos anos nós fomos alertados dos malefícios potenciais que nossos filhos teriam de enfrentar se os tivéssemos. Nos disseram que éramos inadequadas, incompletas, possivelmente depravadas e que nossos filhos seriam perseguidos.

Só que apenas essa última previsão está se provando verdadeira.

Ele está se provando verdadeira porque as pessoas que fizeram a previsão estão se certificando que ela se cumpra.”

Blogueiro de South Jordan, Utah, Viliami Pauni é casado com quatro filhas, e também expressou seus sentimentos de dor e desconforto:

“Quando as alterações no Manual da Igreja vazaram eu estava dirigindo para jantar com um amigo. Do assento do passageiro ele leu em voz alta as mudanças. Eu senti como se tivesse sido chutado no coração. Eu mascarei a maioria das minhas emoções. Os amigos com quem jantaria naquela noite estão todos envolvidos em Estudos Mórmons de alguma forma ou de outra, pelo que foi natural para nós falar sobre as mudanças. Nossa discussão foi principalmente cerebral. Eu não acho que nenhum de nós estava pronto e disposto a discutir os nossos sentimentos mais íntimos. Eu gostaria de ter dito mais. Eu gostaria de ter compartilhado sentimentos e não apenas pensamentos. Saí inquieto e insatisfeito.

Eu não consegui dormir naquela noite. Levantei-me em silêncio de minha cama e desci. Sentei-me, coloquei minha cabeça em minhas mãos, e comecei a chorar. Eu fiquei assim por algum tempo. Eu me perguntava por que eu estava sofrendo? Minha alma foi incomodada. Algo estava muito errado. Por que eu estava escolhendo sofrer quando o sofrimento era opcional? Porque não simplesmente desengatar? O sofrimento pode acabar a qualquer momento que eu quisesse. Por quê? Por quê? Por quê? A resposta veio em um momento de inspiração e clareza.

Porque eu sou Mórmon! Eu sempre serei Mórmon. Eu posso não frequentar mais à igreja, mas este é o meu povo. No batismo eu foi selado a todos os Mórmons em uma relação de aliança … A dor é obrigatória. O sofrimento é opcional, mas quando se trata de meus irmãos e irmãs no evangelho, eu escolho sofrer com você. Somos uma família e as famílias são eternas.”

O advogado formado pela BYU Joseph A. Hollenbaugh ofereceu uma análise e ponderação mais racional com uma ótima visão para jurisprudência:

Confesso, a meu primeira reação foi de completa confusão. Eu tenho sido associado de várias formas com a Igreja SUD por mais de cinqüenta anos, trabalhando em muitos papéis com acesso a informações restritas. Eu ganhei diplomas em jornalismo e em direito pela BYU, e contribui para um texto na jurisprudência de menores em Utah. Esta nova política inicialmente me pareceu totalmente fora de caráter para a Igreja, e como uma manobra completamente idiota. Infelizmente, eu finalmente percebi que não é nada disso; é, sim, bastante característico, e desonestamente inteligente do ponto de vista dos líderes da Igreja.

Desde seus primeiros dias, a Igreja nunca se esquivou de identificar-se com o poder. Ela proclama-se um reino, o Reino de Deus na terra. O fundador da Igreja, Joseph Smith, declarou-se o porta-voz de Deus, e afirmou que só ele possuía o poder de vincular os céus. A doutrina da Igreja considera explicitamente a Igreja como o repositório exclusivo da autoridade necessária para reconciliar os homens com Deus (ver Regras de Fé 4 e 5).

A própria Igreja detém o poder final de determinar quem pode e quem não pode, obter o mais importante dos dons e recompensas de Deus.

Para os crentes, não pode haver desejo maior do que manter uma “boa posição” dentro da Igreja, o que equivale a aceitação do próprio Deus. Perder o seu lugar na fé (ou nunca ganhá-lo) é perder o seu lugar com Deus. É a rejeição final, o fracasso final, e a perda final. É alguma surpresa que os líderes da Igreja exercem esse poder fervorosamente e com ciúmes? E esta última manobra contra casais homossexuais é simplesmente isso; um exercício do poder cru.

Você poderia dizer que é óbvio, mas para quê? Por quê isso? Mas o poder não precisa de motivo; é a sua própria motivação. No entanto, o poder de punir crianças inocentes, ou reter “bênçãos” delas, parece inteiramente gratuita na superfície. Esta política, no entanto, não é sobre punir crianças. Trata-se de explorar crianças. Sim, exploração. Assim, usando crianças como um meio para um fim. Assim, usando crianças como alavanca para controlar os pais e as famílias extendidas e os tribunais do Zona Montanhosa dos Estados Unidos.”

O restante do seu artigo é uma análise competente dos mecanismos e relações de poder e vale a pena da leitura, para quem se interessar e puder ler em inglês.

A blogueira Emily Belanger também abriu seu coração sobre a dor das mudanças e a triste reação de muitos membros à dor dos outros e a ansiedade entre o vazamento das mudanças e sua confirmação ou anúncio oficial:

“Nestas 24 horas de silêncio, muitos mórmons, incluindo fiéis, sóbrios, membros com recomendações ao templo, lamenteram pelas crianças e famílias afetadas.

Enquanto a relações-pública da Igreja, os apóstolos e o profeta (assumindo que a sua saúde o permitiu) corriam loucamente para criar a mais perfeita resposta em vídeo possível, o silêncio deles abriu a porta à especulação de cada corredor imagináveis do espectro Mórmon. De Kate Kelly re-ecoando a sua convicção de que os membros que já não encontram alegria na Igreja devem simplesmente deixá-la, até o blog ‘Mulher Mórmon Comportada’ [o desenho ‘Frozen’ é uma conspiração gay!], que imediatamente defendeu a política da Igreja com fundamentos da lógica muito tortuosos.”

Enquanto membros da Igreja expressavam descrença e angústia por causa dessa nova política discriminatória, muitos outros membros assumiram uma ofensiva postura defensiva, acusando-a de querer sair da Igreja. Embora Belanger seja inequívoca em sua determinação a permanecer na fé, rebate a postura pouco caridosa desses membros:

“Se eu saísse, não seria porque, como Lamã e Lemuel, eu deixei de orar ou assumi que Deus não quis revelar nada para mim. Seria porque eu orei e me senti confiante de que o Senhor confirmou minha decisão de sair. Mas eu fico porque minhas orações confirmam que há beleza e verdade na Igreja, que é o lugar para mim.

Se eu saísse, não seria porque eu era muito ignorante para examinar a situação da Igreja ou das escrituras. Seria porque eu estudei e encontrei respostas que diferiam das posturas da Igreja. Mas eu fico porque eu ainda não encontrei respostas que diferem das doutrinas fundamentais da Igreja.

Se eu saísse, não seria porque eu era intolerante de pontos de vista conservadores de membros da igreja. Eu sairia porque muitos dos meus colegas membros da igreja tem falhado consistentemente em expressar amor para com os filhos de nossos Pais Celestiais. Mas eu continuo porque, para as muitas vezes que eu ouvi palavras ofensivas para com aqueles fora da Igreja, eu mais freqüentemente ouço palavras de amor.”

O desabafo de outra Mórmon apenas indiretamente afetada também está rodando pelas mídias sociais:

“Por que a igreja aceita que eles atravessem a infância e adolescência sem o dom do Espírito Santo ou a capacidade de participar plenamente nos chamados / passeios ao templo / abençoar e distribuir o sacramento e outros eventos que exigem que você seja um membro batizado?

Quando você descompacta isto e analisa as mensagens, percebe-se que debaixo do amor / bondade / não deseja adicionar à família estresse / tensão ….. pode ser que o que eles realmente não querem é ter essas crianças lá na Igreja. Eles não estão apenas preocupados com a mensagem que ouvirão, mas a influência que serão. Estas crianças irão partilhar as suas perspectivas e os outros vão ouvi-las. Quando as pessoas têm filhos em sua ala nestas situações que vão ser expostos a quão regulares, normais, e incríveis eles são. Eles vão ver as suas famílias e os pais (mesmo de vez em quando, para eventos). Sua influência vai se espalhar e continuar a mudar as atitudes e os corações relativos a estas questões.

Isso faz você se perguntar se isso é realmente sobre contenção misturado com outras coisas (recusa de reconhecer até mesmo os pais em certificados de bênçãos / batismo / ordenanças / listados como unidade familiar em registros da igreja), o que é realmente triste.”

O jornal The Salt Lake Tribune pediu para leitores que fossem membros ativos da Igreja SUD expressarem suas reações e seus sentimentos com relação as novas medidas discriminatórias. Eis uma seleção:

Nikki Packer, Presidente da Primária da Ala:

“Estou absolutamente desconsolada. Não parece haver nenhuma necessidade real adotar essa política. Nós batizamos crianças o tempo todo que têm um ou mais pais que não crêem ou não estão dignos. Esta política é tão dolorosa para os membros gays que amam o evangelho (e muitos amam). Fazer isso intencionalmente não parece reflexivo da missão de Cristo. “

Alice Roberts, ex-Presidente da Primária e da Sociedade de Socorro da Ala:

“Eu estou lutando para conciliar como esta política é de qualquer forma aceitável. Os líderes da Igreja afirmaram no passado que é OK para um membro ativo apoiar o casamento homossexual, mas agora parece que isso se aplica somente se não é o casamento homossexual de seus próprios pais. Acho que as implicações desta política são assustadoras. Se o casamento homossexual é apostasia, isso significa que aqueles que associam com seus familiares LGBT casados estão associando-se com apóstatas e será desqualificado para uma recomendação para o templo? “

Judd Bagley, que serviu em várias posições de liderança local:

“A política contra permitir que as crianças nas uniões homossexuais para se juntar à igreja é absolutamente desconcertante para mim. Eu não posso começar a ver uma razão legítima para isso e, de fato, se batismo é de fato uma ordenança de salvação, isso me parece cruel e profundamente anticristão. Excluindo alguém da associação pelo o que eles escolhem fazer é uma coisa, mas punir alguém pelo o que qualquer outra pessoa faça é inaceitável. “

Cosette Johnson Blanchard, ex-Presidente da Sociedade de Socorro da Ala:

“Meu coração está partido, eu sou uma mãe de três filhos, dois que se identificam como gay. Todos os meus filhos o amam e apoiam uns aos outros. Temos cultivado um vínculo familiar forte. Este anúncio tenta quebrar essas ligações familiares fortes. Isso não permitiremos. Eu não sei o que o futuro reserva para a minha família. Uma coisa que eu sei é que o núcleo da minha família vai ficar junto, reforçar-se mutuamente e levantar uns aos outros, não importa o que ocorra! Nós não vamos deixar a igreja nos ditar o que é uma Família! Quaisquer futuros parceiros, cônjuges e netos que entrem em nosso círculo de qualquer maneira com as quais sejamos abençoados, serão igualmente amados incondicionalmente em nossa família! “

Scott Heffernan, ex-Presidente do Quórum de Élderes:

“É horrível É de partir o coração. Eu sou geralmente a pessoa mais calma para o qual podem vir com suas angústias religiosas. Mas isso tem me abalado ao cerne. Eu nunca senti isso; Eu me sinto paralisado. Eu nunca me senti assim conturbado em relação à igreja. Eu não sei o que eu vou fazer. “

Ben Coverston, ex-Presidente de Ramo:

“A política é intolerante. Não há nada amoroso ou pastoral nisso. Eu não acho que eu posso esperar mais 10 a 20 anos para a igreja consertar isso. Eles precisam parar com isso. Agora.”

Philip Barlow, professor de História Mórmon na Utah State University, deu uma entrevista afirmando que respeitava a decisão de seus líderes na Igreja e não acreditava que fora uma “ação de ódio”.

Contudo, mantinha suas reservas pessoais.

“Eu me preocupo com a igreja que isso possa causar mais dor do que ajudar. A questão tem potência suficiente para rasgar ainda mais no tecido social da igreja ao longo do tempo.”

Barlow crê que líderes SUD estão preocupados que se não “aumentarem as barreiras” sobre casamento homossexual dessa maneira, ele será cada vez mais aceito por Mórmons no futuro, fato que já ocorre no momento.

Barlow ainda reconhece os paralelos entre as reações institucionais contra casais gays e contra poligamistas, ressaltando que ele pessoalmente jamais teria urgido tais mudanças.

“Há uma certa consistência, mas na aplicação da vida real, a consistência tem de ser negociada com os princípios de circunstâncias e amor e paciência, que são também os princípios do evangelho que a Igreja defende”.

Barlow confessa ter-se sentido “deprimido” quando tomou conhecimento da nova política. Diz-se conflitado entre ser um Mórmon fiel e ter compaixão por seus amigos que sofrem por ser SUD e gay ou por ser Mórmon e ter um filho gay.

“Isso vai colocar filhos, irmãos e pais em uma posição, onde alguns se sentem que eles vão ter que escolher entre sua família e sua igreja.”

A jornalista Jana Riess, colunista do Religion News Service uma Mórmon ativa, acredita que há métodos mais suaves e humanizados para se lidar com a dissonância entre a vida religiosa e a vida familiar de crianças.

“Eu venho de uma família onde meu pai tinha doença mental. Havia um monte de problemas e questões com o meu pai. Um dos aspectos mais libertadores da teologia SUD para mim é que eu só sou responsável por meus próprios pecados. Eu não tenho que pagar o preço pelo o que meu pai fez. “

Riess também queixou-se de que a nova política é seletivamente discriminatória e inconsistente porque ignora outros tipos de famílias (inclusive, lembrando que filhos de assassinos convictos podem ser abençoados e batizados):

“É muito, muito interessante, que não temos nada como isso para as crianças que nascem fora do casamento em relações heterossexuais. Estou muito triste com isso, porque a fé vinha fazendo progressos em direção a aceitar os gays. E parece que isto é uma espécie de tapa na outra direção. Isso é muito devastador.”

Outro blogueiro Mórmon comenta sobre o significado sociológico da nova política de discriminação:

“É óbvio para todos o que aconteceria se nós deixássemos famílias gays fazerem parte de congregações mórmons: Eles seriam famílias normais mórmons felizes e saudáveis semelhantes as demais, eles falariam como famílias normais mórmons, felizes e saudáveis, eles iriam servir e amar e chorar e dar suas vidas para a igreja como todas as outras, famílias normais mórmons felizes e saudáveis.

Em outras palavras, eles seriam famílias mórmons felizes e saudáveis e as pessoas parariam completamente de perceber que eles eram gays.

Temos zero confiança na capacidade das nossas doutrinas falarem por si e ganharem o dia. Temos zero confiança na capacidade da igreja como um todo para julgar por si mesmos o bem do mal.

Se estivermos errados sobre famílias gays, então vamos pelo menos ter a coragem de confiar em nossas doutrinas até o fim sem sinalização adiante que nós realmente não vamos confiar neles ao processualmente colar no teste desde o início.

A política parece e cheira a covardia.”

E, finalmente, encerremos com o desabafo de outro blogueiro Mórmon:

“Quando se averigua de perto, esta política é sobre exclusão. Eu não quero fazer parte de uma igreja que pratica a exclusão.

Um monte de defesas desta política são, na minha opinião, indefensável. Mas se alguém encontra conforto em pacientemente e com oração à espera de uma alívio para a dor, eu acho que é perfeitamente razoável. Eu estava um pouco surpreso que as declarações do Élder Christofferson que confirmou a lógica orwelliano por trás de “proteger” estas crianças essencialmente por ostracismo.

A igreja está confirmando que eles simplesmente não querem famílias com pais do mesmo sexo envolvidos de qualquer modo. É por isso que coincide com o status automático de apóstata para casais homossexuais. Que é também por isso que não se enquadra com a doutrina fundamental do Mormonismo, que os pecados dos nossos pais não influenciam nossa posição com Deus. Há uma razão porquê Joseph Smith fez a segunda regra de fé, perdendo apenas para a crença em Deus e Cristo. Foi uma grande questão teológica que provavelmente levou-o a orar no bosque, em primeiro lugar. E nós viramos as costas a ele.

Quando ouvi o Élder Christofferson dizer que o casamento homossexual é um pecado tão grave, era difícil levar a sério qualquer coisa que ele dissesse depois disso. Porque eu só não entendo como isso funciona. Não posso aceitar que amar outra pessoa o suficiente para comprometer-se a ele de uma maneira saudável e significativa seja considerado um pecado. Pensei que havíamos superado isso. Em vez disso, estamos redobrando para baixo.

Eu quero que Sião seja real. Mas, para mim, não é um ideal válido de esforço se todos não são convidados.”


A maioria das citações e dos textos foi editada para abreviação. Recomendamos a leitura dos textos na íntegra, que podem ser encontrados nos links respectivos.

69 comentários sobre “Mórmons Reagem Contra Discriminação

  1. Sendo bem sincero, essa nova política da igreja me deixa bastante desanimado com o caminho que a igreja vem tomando. Tenho um primo homossexual que nunca foi aceito pela família e por causa de sua orientação sexual, já até tentou suicídio. Atualmente, vive tentando buscar a cura para sua “enfermidade” em alguns frascos de remédios receitados pelo psiquiatra… enquanto quase todos fazem vista grossa para o quê está acontecendo.

    Voltando ao assunto da igreja, é lamentável que ao invés de batalharmos em busca de respeitarmos as diferenças de cada um e a valorizar o ser humano como irmão e também filho do pai celestial, somos “condicionados” a seguir cegamente aos líderes da igreja, caso contrário, estaremos cometendo apostasia, por mais preconceituosa e discriminatória que suas ordens possam ser.

    Infelizmente como estudo em uma instituição vinculada a igreja sou meio que obrigado a dizer amém a tudo que ensinam, mesmo por mais errado que eu considere. Apesar disso, não vejo a hora de me formar e só então poder avaliar, por mim mesmo, o quê acreditar.
    Só questão de tempo até colocar uns pontos nos “i”s.

    • Diga ao teu primo que Cristo o ama e há pessoas no mundo como eu que o aceitam e respeitam tal como ele é. A base do evangelho realmente verdadeiro é o amor, o respeito ao próximo, a boa convivência com o outro em toda sua diversidade. Sendo assim, tenho certeza que Cristo ama você e teu primo.

      Eu tenho depressão e se o psiquiatra for realmente sério o tal remédio é para depressão ou algum outro transtorno de humor que ele esteja apresentando. Lembre-se de demonstrar amor a ele e de reforçar, sutilmente, a necessidade de um acompanhamento psicoterápico – é lá que ele vai aprender a ser conhecer melhor o que vai dar sentido a estabilidade promovida pelo remédio psiquiátrico.

  2. Quanta dor e aflição, crianças famílias destruídas.
    Parece vingança e manipulação.
    Pregar o ódio e a discriminação.
    Tantos sofrem, tantos sofreram.
    Crianças confusas desoladas, discriminadas.
    Sem apoio, sem paz.
    Sem proteção.
    Tendo que escolher entre amor e a religião.
    Me da repulsa, nojo.
    Querem dominar através da repressão.
    Para mim já basta.
    Para vocês pequeninos, inocentes.
    Não compartilho essa cruel ideologia.
    Que sejam salva todas as criancinhas.
    #odeioadiscriminação

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